I

AO VISCONDE DE A.-T.

 

Londres, Maio.

 

Meu caro patrício .--Só ontem à noite, tarde, ao recolher do campo, encontrei o bilhete com que consideravelmente me honrou, perguntando à minha experiência--«qual é o melhor alfaiate de Londres». Depende isso inteiramente do fim para que V. necessita esse Artista. Se pretende meramente um homem que lhe cubra a nudez com economia e conforto, então recomendo-lhe aquele que tiver tabuleta mais perto do seu Hotel. São tantos passos que forra--e, como diz o Eclesiastes , cada passo encurta a distância da sepultura.

Se porém V., caro patrício, deseja um alfaiate que lhe dê consideração e valor no seu mundo; que V. possa citar com orgulho, à porta da Havanesa, rodando lentamente para mostrar o corte ondeado e fino da cinta; que o habilite a mencionar os Lordes que lá encontrou, escolhendo de alto, com a ponta da bengala, cheviotes para blusas de caça; e que lhe sirva mais tarde, na velhice, à hora geba do reumatismo, como recordação consoladora de elegâncias moças--então com ardente instância lhe aconselho o Cook (o Tomás Cook), que é da mais extremada moda, absolutamente ruinoso, e falha tudo.

Para subsequentes conselhos de «fornecedores», em Londres ou outros pontos do Universo, permanece sempre ao seu grato serviço.-- Fradique Mendes.

II

A «MADAME» DE JOUARRE

 

(Trad ) 1

 

Paris, Dezembro

 

Minha Querida Madrinha .--Ontem, em casa de Madame de Tressan, quando passei, levando para a ceia Libuska, estava sentada, conversando consigo, por debaixo do atroz retrato da Marechala de Moy, uma mulher loira, de testa alta e clara, que me seduziu logo, talvez por lhe pressentir, apesar de tão indolentemente enterrada num divã, uma rara graça no andar, graça altiva e ligeira de Deusa e de ave. Bem diferente da nossa sapiente Libuska, que se move com o esplêndido peso de uma estátua! E do interesse por esse outro passo, possivelmente alado e diânico (de Diana), provém estas garatujas.

Quem era? Suponho que nos chegou do fundo da provincia, de algum velho castelo do Anju com erva nos fossos, porque me não lembro de ter encontrado, em Paris, aqueles cabelos fabulosamente loiros como o sol de Londres em Dezembro--nem aqueles ombros descaídos, dolentes, angélicos , imitados de uma madona de Montegna, e inteiramente desusados em França desde o reinado de Carlos X, do Lírio no Vale , e dos corações incompreendidos. Não admirei com igual fervor o vestido preto, onde reinavam coisas escandalosamente amarelas. Mas os braços eram perfeitos; e nas pestanas, quando as baixava, parecia pender um romance triste. Deu-me assim a impressão, ao começo, de ser uma elegíaca do tempo Chateaubriand. Nos olhos, porém, surpreendi-lhe depois uma faísca de vivacidade sensível--que a datava do século XVIII. Dirá a minha madrinha:--«como pude eu abranger tanto, ao passar, com Libuska ao lado fiscalizando?» É que voltei. Voltei, e da ombreira da porta readmirei os ombros dolentes de virgem do século XIII; a massa de cabelos que o molho de velas por trás, entre as orquídeas, nimbava de ouro; e sobretudo o subtil encanto dos olhos--dos olhos finos e lânguidos... Olhos finos e lânguidos . É a primeira expressão em que hoje apanho decentemente a realidade.

Por que é que não me adiantei, e não pedi uma «apresentação?» Não sei. Talvez o requinte em retardar , que fazia com que La Fontaine, dirigindo-se mesmo para a felicidade, tomasse sempre o caminho mais longo. Sabe o que dava tanta sedução ao palácio das Fadas, nos tempos do rei Artur? Não sabe. Resultados de não ler Tennyson... Pois era a imensidade de anos que levava a chegar lá, através de jardins encantados, onde cada recanto de bosque oferecia a emoção inesperada dum flirt , duma batalha, ou dum banquete... (Com que mórbida propensão acordei hoje para o estilo asiático!) O facto é que, depois da contemplação junto à ombreira, voltei a cear ao pé da minha radiante tirana. Mas por entre o banal sandwich de foie-gras , e um copo de Tokay em nada parecido com aquele Tokay que Voltaire, já velho, se recordava de ter bebido em casa de Madame de Etioles (os vinhos dos Tressans descendem em linha varonil dos venenos da Brinvilliers), vi, constantemente vi, os olhos finos e lângidos . Não há senão o homem, entre os animais, para misturar a languidez de um olhar fino a fatias de foie-gras . Não o faria decerto um cão de boa raça. Mas seriamos nós desejados pelo «efémero feminino», se não fosse esta providencial brutalidade? Só a porção de Matéria que há no homem, faz com que as mulheres se resignem à incorrigível porção de Ideal, que nele há também --para eterna perturbação do Mundo. O que mais prejudicou Petrarca aos olhos de Laura--foram os Sonetos . E quando Romeu, já com um pé na escada de seda, se demorava, exalando o seu êxtase em invocações à Noite e à Lua-- Julieta batia os dedos impacientes no rebordo do balcão, e pensava: «Ai, que palrador que és, filho dos Montaigus!» Este detalhe não vem em Shakespeare--mas é comprovado por toda a Renascença. Não me amaldiçoe por esta sinceridade de meridional céptico, e mande-me dizer que nome tem, a sua paróquia, a loira castelã do Anju. A propósito de castelos: cartas de Portugal anunciam-me que o quiosque, por mim mandado erguer em Sintra, na minha quintarola, e que lhe destinava como «seu pensadouro e retiro nas horas de sesta»--abateu. Três mil e oitocentos francos achatados em entulho. Tudo tende à ruína num país de ruínas. O arquitecto que o construiu é deputado, e escreve no Jornal da Tarde estudos melancólicos sobre as Finanças! O meu procurador em Sintra aconselha agora, para reedificar o quiosque, um estimável rapaz, de boa família, que entende de construções e que é empregado na Procuradoria-Geral da Coroa! Talvez se eu necessitasse um jurisconsulto, me propusessem um trolha. É com estes elementos alegres, que nós procuramos restaurar o nosso império de África! Servo humilde e devoto.--FRADIQUE.

III

A OLIVEIRA MARTINS

 

Paris, Maio

 

Querido Amigo .--Cumpro enfim a promessa feita na sua erudita ermida das Águas Férreas, naquela manhã de Março em que conversávamos ao sol sobre o carácter dos Antigos, --e remeto, como documento, a fotografia da múmia de Rameses II (que o francês banal, continuador do grego banal, teima em chamar Sesóstris), recentemente descoberta nos sarcófagos reais de Medinet-Abou pelo professor Maspero.

Caro Oliveira Martins, não acha V. picarescamente sugestivo este facto-- Ramsés fotografado ?... Mas aí está justificada a mumificação dos cadáveres, feita pelos bons Egípcios com tanta fadiga e tanta despesa, para que os homens gozassem na sua forma terrena, segundo diz o Escriba, «as vantagens da Eternidade!» Rameses, como ele acreditava e lhe afirmavam os metafísicos de Tebas, ressurge efectivamente «com todos os seus ossos e a pele que era sua», neste ano da Graça de 1886. Ora 188ó, para um Faraó da décima-nona dinastia, mil e quatrocentos anos anterior a Cristo, representa muito decentemente a Eternidade e aVida Futura . E eis-nos agora, podendo contemplar as «próprias feições» do maior dos Ramesidas, tão realmente como Hokem seu Eunuco-Mor, ou Pentaour seu Cronista-Mor, ou aqueles que outrora em dias de triunfos corriam a juncar-lhe o caminho de flores, trazendo «os seus chinós de festa e a cútis envernizada com óleos de Segabai». Aí o tem V. agora diante de si, em fotografia, com as pálpebras baixas e sorrindo. E que me diz a essa face real? Que humilhantes reflexões não provoca ela sobre a irremediável degeneração do homem! Onde há aí hoje um, entre os que governam povos, que tenha essa soberana fronte de calmo e incomensurável orgulho; esse superior sorriso de omnipotente benevolência, duma inefável benevolência que cobre o Mundo; esse ar de imperturbada e indomável força; todo esse esplendor viril que a treva de um hipogeu, durante três mil anos, não conseguiu apagar? Eis aí verdadeiramente um Dono de homens ! Compare esse semblante augusto com o perfil sorno, oblíquo e bigodoso dum Napoleão III; com o focinho de buldogue acorrentado dum Bismarque; ou com o carão do Czar russo, um carão parado e afável que podia ser o do seu Copeiro-Mor. Que chateza, que fealdade tacanha destes rostos de poderosos!

Donde provém isto? De que a alma modela a face, como o sopro do antigo oleiro modelava o vaso fino:--e hoje, nas nossas civilizações, não há lugar para que uma alma se afirme e se produza na absoluta expansão da sua força. Outrora um simples homem, um feixe de músculos sobre um feixe de ossos, podia erguer-se e operar como um elemento da Natureza. Bastava ter o ilimitado querer--para dele tirar o ilimitado poder. Eis aí em Rameses um ser que tudo quer e tudo pode, e a quem Ftás, o Deus sagaz, diz com espanto: «a tua vontade dá a vida e a tua vontade dá a morte!» Ele impele a seu bel-prazer as raças para Norte, para Sul ou para Leste; ele altera e arrasa, como muros num campo, as fronteiras dos reinos; as cidades novas surgem das suas pegadas; para ele nascem todos os frutos da terra, e para ele se volta toda a esperança dos homens; o lugar para onde volve os seus olhos é bendito e prospera, e o lugar que não recebe essa luz benéfica jaz como «o terrão que o Nilo não beijou»os deuses dependem dele, e Amnon estremece inquieto quando, diante dos pilones do seu templo Rameses faz estalar as três cordas entrançada.s do seu látego de guerra! Eis um homen --e que seguramente pode afirmar no seu canto triunfal: --«Tudo vergou sob a minha força: eu vou e venho com as passadas largas dum leão; o rei dos deuses está à minha direita e também à minha esquerda; quando eu falo o Céu escuta; as coisas da Terra estendem-se a meus pés, para eu as colher com mão livre; e para sempre estou erguido sobre o trono do mundo!»

«O mundo», está claro, era aquela região, pela maior parte arenosa, que vai da cordilheira Líbica à Mesopotamia: e nunca houve mais petulante ênfase do que nas Panegíricas dos Escribas. Mas o homem é, ou supõe ser, inigualavelmente grande. E esta consciência da grandeza, do incircunscrito poder vem necessariamente resplandecer na fisionomia e dar essa altiva majestade, repassada de risonha serenidade, que Rameses conserva mesmo além da vida, ressequido, mumificado, recheado de betume da Judeia.

Veja V., por outro lado, as condições que cercam hoje um poderoso do tipo Bismarque. Um desgraçado desses não está acima de nada e depende de tudo. Cada impulso da sua vontade esbarra com a resistência dum obstáculo. A sua acção, no Mundo, é um perpétuo bater de crânio contra espessuras de portas bem defendidas. Toda a sorte de convenções, de tradições, de direitos, de preceitos, de interesses, de princípios, se lhe levanta a cada instante diante dos passos, como marcos sagrados. Um artigo de jornal fá-lo estacar, hesitante. A rabulice dum legista obriga-o a encolher, precipitadamente, a garra que já ia estendendo. Dez burgueses nédios e dez professores guedelhudos, votando dentro duma sala, estatelam por terra o alto andaime dos seus planos. Alguns florins dentro dum saco, tornam-se o tormento das suas noites. É-lhe tão impossível dispor dum cidadão como dum astro. Nunca pode avançar duma arrancada, erecto e seguro tem de ser ondeante e rastejante. A vigilância ambiente impõe-lhe a necessidade vil de falar baixo e aos cantos. Em vez de «recolher as coisas da terra, com mão livre»--surripia-as às migalhas, depois de escuras intrigas. As i rresis tíveis correntes de ideias, de sentimentos, de interesses, trabalham por baixo dele, em torno dele: e parecendo dirigi-las, pelo muito que braceja e ronca de alto, é na realidade por elas arrastado. Assim um omnipotente, do tipo Bismarque, vai por vezes em aparência no cimo das grandes coisas;--mas como a bóia solta, vai no cimo da torrente.

Miserável omnipotência! E o sentimento desta miséria não pode deixar de influenciar a fisionomia dos nossos poderosos, dando-lhe esse feitio contrafeito, crispado, torturado, azedado e sobretudo amolgado que se nota na cara de Napoleão, do Czar, de Bismarque, de todos os que reúnem a maior soma de poder contemporaneo--o feitio amolgado duma coisa que rola aos encontrões, batendo contra muralhas.

Em conclusão:--a múmia de Rameses II (única face autêntica do homem antigo que conhecemos) prova que, tendo-se tornado impossível uma vida humana, vivida na sua máxima liberdade e na sua máxima força, sem outros limites que os do próprio querer--resultou perder-se para sempre, no tipo físico do homem, a suma e perfeita expressão da grandeza. Já não há uma face sublime: há carantonhas mesquinhas, onde a bilis cava rugas por entre os recortes do pêlo. As únicas fisionomias nobres são as das feras, genuinos Rameses no seu deserto, que nada perderam da sua força, nem da sua liberdade. O homem moderno, esse, mesmo nas alturas sociais, é um pobre Adão achatado entre as duas páginas dum código.

Se V. acha tudo isto excessivo e fantasista, atribua-o a que jantei ontem, e conversei inevitavelmente, com o seu correligionário P., conselheiro de Estado, e muchas cosas más . Más em epanhol; e más também em português no sentido de péssimas. Esta carta é a reacção violenta da conversa conselheiral e conselheirífera. Ah, meu amigo, desditoso amigo, que faz V. depois de receber o fluxo labial dum conselheiro? Eu tomo um banho por dentro--um banho lustral, imenso banho de fantasia, onde despejo, como perfume idóneo, um frasco de Shelley ou de Musset. Amigo certo et nunc et semper .-- Fradique Mendes.

IV

A MADAME S.

 

Paris, Fevereiro.

 

Minha Cara Amiga .--O espanhol chama-se Dom Ramon Covarubia, mora na Passage Saulnier, 12, e como é aragonês, e portanto sóbrio, creio que com dez francos por lição se contentará amplamente. Mas se seu filho já sabe o castelhano necessário para entender os Roma nceros , o D. Quixote , alguns dos « Picarescos», vinte páginas de Quevedo, duas comédias de Lope de Vega, um ou outro romance de Galdós, que é tudo quanto basta ler na literatura de Espanha,--para que deseja a minha sensata amiga que ele pronuncie esse castelhano que sabe com o acento, o sabor, e o sal dum madrileno nascido nas veras pedras da Calle-Mayor ? Vai assim o doce Raul desperdiçar o tempo, que a Sociedade lhe marcou para adquirir ideias e noções (e a Sociedade a um rapaz da sua fortuna, do seu nome e da sua beleza, apenas concede, para esse abastecimento intelectual, sete anos, dos onze aos dezoito)--em quê? No luxo de apurar até a um requinte superfino, e supérfluo, o mero instrumento de adquirir noções e ideias. Porque as línguas, minha boa amiga, são apenas ins trumentos do saber--c omo instrumentos de lavoura. Consumir energia e vida na aprendizagem de as pronunciar tão genuína e puramente, que pareça que se nasceu dentro de cada uma delas, e que, por meio de cada uma, se pediu o primeiro pão e água da vida--é fazer como o lavrador, que em vez de se contentar, para cavar a terra, com um ferro simples encabado num pau simples, se aplicasse, durante os meses em que a horta tem de ser trabalhada, a embutir emblemas no ferro e esculpir flores e folhagens ao comprido do Pau. Com um hortelão assim, tão miudamente ocupado em alindar e requintar a enxada, como estariam agora, minha senhora, os seus pomares da Touraine?

Um homem só deve falar, com impecável segurança e pureza, a língua da sua terra:--todas as outras as deve falar mal, orgulhosamente mal, com aquele acento chato e falso que denuncia logo o estrangeiro. Na língua verdadeiramente reside a nacionalidade;--e quem for possuindo com crescente perfeição os idiomas da Europa, vai gradualmente sofrendo uma desnacionalização. Não há já para ele o especial e exclusivo encanto da fala materna , com as suas influências afectivas, que o envolvem, o isolam das outras raças; e o cosmopolitismo do Verbo irremediavelmente lhe dá o cosmopolitismo do carácter. Por isso o poliglota nunca é patriota. Com cada idioma alheio que assimila, introduzem-se-lhe no organismo moral modos alheios de pensar, modos alheios de sentir. O seu patriotismo desaparece, diluido em estrangeirismo. Rue de Rivoli , Calle d'Alcalá , Regent Street , Willelm Strasse --que lhe importa? Todas são ruas, de pedra ou de macadame. Em todas a fala ambiente lhe oferece um elemento natural e congénere , onde o seu espírito se move livremente, espontaneamente, sem hesitações, sem atritos. E como pelo Verbo, que é o instrumento essencial da fusão humana, se pode fundir com todas--em todas sente e aceita uma Pátria.

Por outro lado, o esforço contínuo de um homem para se exprimir, com genuína e exacta propriedade de construção e de acento, em idiomas estranhos--isto é, o esforço para se confundir com gentes estranhas no que elas têm de essencialmente característico, o Verbo--apaga nele toda a individualidade nativa. Ao fim de anos esse habilidoso, que chegou a falar absolutamente bem outras línguas além da sua, perdeu toda a originalidade de espírito--porque as suas ideias, forçosamente, devem ter a natureza, incaracterística e neutra, que lhes permita serem indiferentemente adaptadas às línguas mais opostas em carácter e génio. Devem, de facto, ser como aqueles «corpos de pobre» de que tão tristemente fala o povo--«que cabem bem na roupa de toda a gente».

Além disso, o propósito de pronunciar com perfeição línguas estrangeiras, constitui uma lamentável sabujice para com o estrangeiro. Há ai, diante dele, como o desejo servil de não sermos nós mesmos , de nos fundirmos nele, no que ele tem de mais seu, de mais próprio, o Vocábulo. Ora isto é uma abdicação de dignidade nacional. Não, minha senhora! Falemos nobremente mal, patrioticamente mal, as línguas dos outros! Mesmo porque aos estrangeiros o poliglota só inspira desconfiança, como ser que não tem raíes, nem lar estável--ser que rola através das nacionalidades alheias, sucessivamente se disfarça nelas, e tenta uma instalação de vida em todas, porque não é tolerado por nenhuma. Com efeito, se a minha amiga percorrer a Gazeta dos Tribunais , verá que o perfeito poliglotismo é um instrumento de alta escroquerie .

E aqui está como, levado pelo diletantismo das ideias, em vez dum endereço eu lhe forneço um tratado!... Que a minha garrulice ao menos a faça sorrir, pensar, e poupar ao nosso Raul o trabalho medonho de pronunciar Viva la Gracia! e Benditos sean tus ojos ! exactissimamente como se vivesse a uma esquina da Puerta del Sol , corn uma capa de bandas de veludo, chupando o cigarro de Lazarillo. Isto todavia não impede que se utilizem os serviços de D. Ramon. Ele, além de Zorrilista, é guitarrista; e pode substituir as lições na língua de Quevedo, por lições na guitarra de Alma viva. O seu lindo Raul ganhará ainda assim uma nova faculdade de exprimir--a faculdade de exprimir emoções por meio de cordas de arame. E este dom é excelente! Convém mais na mocidade, e mesmo na velhice, saber, por meio das quatro cordas duma viola, desafogar a alma das coisas confusas e sem nome que nela tumultuam, do que poder, através das estalagens do Alundo, reclamar com perfeição o pão e o queijo--em sueco, holandês, grego, búlgaro e polaco.

E será realmente indispensável mesmo para prover, através do Mundo , estas necessidades vitais de estômago e alma--o trilhar, durante anos, pela mão dura dos mestres, «os descampados e atoleiros das gramáticas e pronúncias», como dizia o velho Milton? Eu tive uma admirável tia que falava unicamente o português (ou antes o minhoto) e que percorreu toda a Europa com desafogo e conforto. Essa senhora, risonha mas dispéptica, comia simplesmente ovos--que só conhecia e só compreendia sob o seu nome nacional e vernáculo de ovos. Para ela huevos , oeufs , eggs , das ei , eram sons da Natureza bruta, pouco diferençáveis do coaxar das rãs, ou dum estalar de madeira. Pois quando em Londres, em Berlim, em Paris, em Moscovo, desejava os seus ovos-- esta expedita senhora reclamava o fâmulo do Hotel, cravava nele os olhos agudos e bem explicados, agachava-se gravemente sobre o tapete, imitava com o rebolar lento das saias tufadas uma galinha no choco, e gritava qui-qui-ri-qui! có-có-ri-qui! có-ró-có-có . Nunca, em cidade ou religião inteligente do Universo, minha tia deixou de comer os seus ovos--e superiormente frescos!

Beijo as suas mãos, benévola amiga.--FRADIQUE.

V

A GUERRA JUNQUEIRO

 

Paris, Maio.

 

Meu Caro Amigo .--A sua carta transborda de ilusão poética. Supor, como V. candidamente supõe, que traspassando com versos (ainda mesmo seus, e mais rutilantes que as flechas de Apolo) a Igreja, o Padre, a Liturgia, as Sacristias, o jejum da sexta-feira e os ossos dos Mártires, se pode «desentulhar Deus da aluvião sacerdotal», e elevar o Povo (no Povo V. decerto inclui os conselheiros de Estado) a uma compreensão toda pura e abstracta da Religião--a uma religião que consista apenas numa Moral apoiada numa Fé--é ter da Religião, da sua essência e do seu objecto, uma sonhadora ideia de sonhador teimoso em sonhos!

Meu bom amigo, uma Religião a que se elimine o Ritual desaparece--porque as Religiões para os homens (com excepção dos raros Metafísicos, Moralistas e Místicos) não passa dum conjunto de Ritos, através dos quais cada povo procura estabelecer uma comunicação íntima com o seu Deus e obter dele favores. Este, só este, tem sido o fim de todos os cultos, desde o mais primitivo, do culto de Indra, até ao culto recente do coração de Maria, que tanto o escandaliza na sua paróquia--oh incorrigível beato do idealismo! Se V. o quer verificar historicamente, deixe Viana do Castelo, tome um bordão, e suba comigo por essa antiguidade fora até um sítio bem cultivado e bem regado que fica entre o rio Indo, as escarpas do Himalaia, e as areias dum grande deserto . Estamos aqui em Septa-Sindhou, no país das Sete Águas, no Vale Feliz, na terra dos Árias. No primeiro povoado em que pararmos, V. vê, sobre um outeiro, um altar de pedra coberto de musgo fresco: em cima brilha palidamente um fogo lento: e em torno perpassam homens, vestidos de linho, com os longos cabelos presos por um aro de ouro fino. São padres, meu amigo! São os primeiros capelães da Humanidade,--e cada um deles está, por esta quente alvorada de Maio, celebrando um rito da missa Ariana. Um limpa e desbasta a lenha que há-de nutrir o lume sagrado; outro pisa dentro dum almofariz, com pancadas que devem ressoar «como tambor de vitória», as ervas aromáticas que dão o Sômma; este, como um semeador, espalha grãos de aveia em volta da Ara; aquele, ao lado, espalmando as mãos ao Céu, entoa um cântico austero. Estes homens, meu amigo, estâo executando um Rito que encerra em si toda a Religião dos Árias, e que tem por objecto propiciar Indra-- Indra, o Sol, o Fogo, a potência divina que pode encher de ruina e dor o coração do Ária, sorvendo a água das regas, queimando os pastos, desprendendo a pestilência das lagoas, tornando Septa-Sindhou mais estéril que o «coração do mau»; ou pode, derretendo as neves do Himalaia, e soltando com um golpe de fogo «a chuva que jaz no ventre das nuvens», restituir a água aos rios, a verdura aos prados, a salubridade às lagoas, a alegria e abundância à morada do Ária. Trata-se pois simplesmente de convencer Indra a que, sempre propício, derrame sobre Septa-Sindhou todos os favores que pode apetecer um povo rural e pastoral.

Não há aqui Metafisica, nem Ética--nem explicações sobre a natureza dos deuses, nem regras para a conduta dos homens. Há meramente uma Liturgia, uma totalidade de Ritos, que o Ária necessita observar para que Indra o atenda --uma vez que, pela experiência de gerações, se comprovou que Indra só o escutará, só concederá os beneficios rogados, quando em torno ao seu altar certos velhos, de certa casta, vestidos de linho cândido, lhe erguerem cânticos doces, lhe ofertarem libações, lhe amontoarem dons de fruta, mel e carne de anho. Sem dons, sem libações, sem cânticos, sem anho, Indra, amuado e sumido no fundo do Invisível e do Intangível, não descerá à Terra a derramar-se na sua bondade. E se vier de Viana do Castelo um Poeta tirar ao Ária o seu altar de musgo, o seu pau sacrossanto, o almofariz, o crivo e o vaso do Soma , o Ária ficará sem meios de propiciar o seu Deus, desatendido do seu Deus--e será na Terra como a criancinha que ninguém nutre e a que ninguém ampara os passos.

Esta religião primordial é o tipo absoluto e inalterável das Religiões, que todas por instinto repetem--e em que todas (apesar dos elementos estranhos de Teologia, de Metafísica, de Ética que lhe introduzem os espíritos superiores) terminam por se resumir com reverência. Em todos os climas, em todas as raças, ou divinizando as forças da Natureza, ou divinizando a Alma dos mortos, as Religiões, amigo meu, consistiram sempre praticamente num conjunto de práticas, pelas quais o homem simples procura alcançar da amizade de Deus os bens supremos da saúde, da força, da paz, da riqueza. E mesmo quando, já mais crente no esforço próprio, pede esses bens à higiene, à ordem, à lei e ao trabalho, ainda persiste nos ritos propiciadores para que Deus ajude o seu esforço.

O que V. observou em Septa-Sindhou poderá verificar igualmente, parando (antes de recolhermos a Viana, a beber esse vinho verde de Monção, que V. ditirambiza) na Antiguidade Clássica, em Atenas ou Roma, onde quiser, no momento de maior esplendor e cultura das civilizações greco-latinas. Se V. aí perguntar a um antigo, seja um oleiro de Suburra, seja o próprio Flamen Dialis , qual é o corpo de doutrinas e de conceitos morais que compõe a Religião,--ele sorrirá, sem o compreender. E responderá que a Religião consiste em paces deorum quaerere , em apaziguar os Deuses, em segurar a benevolência dos Deuses. Na ideia do antigo isso significa cumprir os ritos, as práticas, as fórmulas, que uma longa tradição demonstrou serem as únicas que conseguem fixar a atenção dos Deuses e exercer sobre eles persuasão ou sedução. E, nesse cerimonial, era indispensável não alterar nem o valor duma silaba na Prece, nem o valor dum gesto no sacrifício, porque doutro modo o Deus, não reconhecendo o Sacrifício da sua dilecção e a Prece do seu agrado, permanecia desatento e alheio; e a Religião falseava o seu fim supremo--influenciar o Deus. Pior ainda! Passava a ser a irreligião: e o Deus, vendo nessa omissão de liturgia uma falta de reverência, despedia logo das Alturas os dardos da sua cólera. A obliquidade das pregas na túnica do Sacrificador, um passo lançado à direita ou movido à esquerda, o cair lento das gotas da libação, o tamanho das achas do lume votivo, todos esses debalhes estavam prescritos imutavelmente pelos Rituais, e a sua exclusão ou a sua alteração constituíam impiedades. Constituíam verdadeiros crimes contra a pátria--porque atraíam sobre ela a indignação dos deuses. Quantas Legiões vencidas, quantas cidadelas derrubadas, porque o Pontífice deixara perder um grão de cinza da ara--ou porque Auruspice não arrancou lã bastante da cabeça do anho! Por isso Atenas castigava o Sacerdote que alterasse o cerimonial; e o senado depunha os Cônsules que cometiam um erro no sacrificio--fosse ele tão ligeiro como reter a ponta da toga sobre a cabeça, quando ela devia escorregar sobre o ombro. De sorte que V., em Roma, lançando ironias de ouro à Divindade, era talvez um grande e admirado Poeta Cómico: mas satirizando, como na Velhice do Padre Eterno a Liturgia e o Cerimonial, era um inimigo público, um traidor ao Estado, votado às masmorras do Tuliano .

E se, já farto destes tempos antigos, V. quiser volver aos nossos filosóficos dias, encontrará nas duas grandes Religiões do Ocidente e do Oriente, no Catolicismo e no Budismo, uma comprovação ainda mais saliente e mais viva de que a Religião consiste intrinsecamente de práticas, sobre as quais a Teologia e a Moral se sobrepuseram, sem as penetrarem, como um luxo intelectual, acessório e transitório--flores pregadas no altar pela imaginação ou pela virtude idealista. O Catolicismo (ninguém mais furiosamente o sabe do que V.) está hoje resumido a uma curta série de observâncias materiais:--e, todavia, nunca houve Religião dentro da qual a Inteligência erguesse mais vasta e alta estrutura de conceitos teológicos e morais. Esses conceitos, porém, obra de doutores e de místicos, nunca propriamente sairam das escolas e dos mosteiros--onde eram preciosa matéria de dialéctica ou de poesia; nunca penetraram nas multidões, para metodicamente governar os juizos ou conscientemente governar as acções. Reduzido a catecismos, a cartilhas, esse corpo de conceitos foi decorado pelo povo:-- mas nunca o povo se persuadiu que tinha Religião, e que portanto agradava a Deus , servia a Deus, só por cumprir os dez mandamentos, fora de toda a prática e de toda a observância ritual E só decorou mesmo esses Dez Mandamentos , e as Obras de Misericórdia , e os outros preceitos morais do Catecismo, pela ideia de que esses versículos, recitados com os lábios , tinham, por uma virtude maravilhosa, o poder de atrair a atenção, a bem-querença e os favores do Senhor. Para servir a Deus, que é o meio de agradar a Deus, o essencial foi sempre ouvir missa, esfiar o rosário, jejuar, comungar, fazer promessas, dar túnicas aos santos, etc. Só por estes ritos, e não pelo cumprimento moral da lei moral, se propicia a Deus,-- isto é, se alcançam dele os dons inestimáveis da saúde, da felicidade, da riqueza, da paz. O mesmo Céu e Inferno, sanção extra-terrestre da lei, nunca, na ideia do povo, se ganhava ou se evitava pela pontual obediência à lei. E talvez com razão, por isso mesmo que no Catolicismo o prémio e o castigo não são manifestações da justiça de Deus, mas da graça de Deus. Ora a Graça, no pensar dos simples, só se obtém pela constante e incansável prática dos preceitos--a missa, o jejum, a penitência, a comunhão, o rosário, a novena, a oferta, a promessa. De sorte que no catolicismo do Minhoto como na religião do Ária, em Septa-Sindhou como em Carrazeda de Ansiães, tudo se resume em propiciar Deus por meio de práticas que o cativem. Não há aqui Teologia, nem Moral. Há o acto do infinitamente fraco, querendo agradar ao infinitamente forte. E se V., para purificar este Catolicismo, eliminar o Padre, a estola, as galhetas e a água benta, todo o Rito e toda a Liturgia--o católico imediatamente abandonará uma Religião que não tem Igreja visível, e que não lhe oferece os meios simples e tangíveis de comunicar com Deus, de obter dele os bens transcendentes para a alma e os bens sensíveis para o corpo. O Catolicismo nesse instante terá acabado, milhões de seres terão perdido o seu Deus. A Igreja é o vaso de que Deus é o perfume. Igreja partida -- Deus volatilizado.

Se tivéssemos tempo de ir à China ou a Ceilão, V. toparia com o mesmo fenómeno no Budismo. Dentro dessa Religião foi elaborada a mais alta das Metafisicas, a mais nobre das Morais: mas em todas as raças em que ele penetrou, nas bárbaras ou nas cultas, nas hordas do Nepal ou no mandarinato chinês, ele consistiu sempre para as multidões em ritos, cerimónias, práticas --a mais conhecida das quais é o moinho de rezar. V. nunca lidou com este moinho? É lamentavelmente parecido com o moinho de café em todos os paises budistas V. o verá colocado nas ruas das cidades, nas encruzilhadas do campo, para que o devoto ao passar, dando duas voltas à manivela, possa fazer chocalhar dentro as orações escritas e comunicar com o Buda, que por esse acto de cortesia transcendente «lhe ficará grato e lhe aumentará os seus bens».

Nem o Catolicismo, nem o Budismo, vão por este facto em decadência. Ao contrário! Estão no seu estado natural e normal de Religião. Uma Religião, quanto mais se materializa, mais se populariza--e portanto mais se diviniza. Não se espante! Quero dizer que, quanto mais se desembaraça dos seus elementos intelectuais de Teologia, de Moral, de Humanitarismo, etc., repelindo-os para as suas regiões naturais que são a Filosofia, a Ética e a Poesia, tanto mais coloca o povo face a face com o seu Deus, numa união directa e simples, tão fácil de realizar que, por um mero dobrar de joelhos, um mero balbuciar de Padre-Nossos, o homem absoluto que está no Céu vem ao encontro do homem transitório que está na Terra. Ora este encontro é o facto essencialmente divino da Religião. E quanto mais ele se materializa--mais ela na realidade se diviniza.

V. porém dirá (e de facto o diz): «Tornemos essa comunicação puramente espiritual, e que, despida de toda a exterioridade litúrgica, ela seja apenas como o espírito humano, falando ao espírito divino». Mas para isso é necessário que venha o Milénio--em que cada cavador de enxada seja um filósofo, um pensador. E quando esse Milénio detestável chegar, e cada tipóia de praça for governada por um Mallebranche, terá V. ainda de ajuntar a esta perfeita humanidade masculina, uma nova humanidade feminina, fisiologicamente diferente da que hoje embeleza a Terra. Porque enquanto houver uma mulher constituída física, intelectual e moralmente como a que Jeová, com uma tão grande inspiração de artista, fez da costela de Adão,--haverá sempre ao lado dela, para uso da sua fraqueza, um altar, uma imagem e um padre.

Essa comunhão mística do Homem e de Deus, que V. quer, nunca poderá ser senão o privilégio duma élite espiritual, deploravelmente limitada. Para a vasta massa humana, em todos os tempos, pagã, budista, cristã, maometana, selvagem ou culta, a Religião terá sempre por fim, na sua essência, a súplica dos favores divinos e o afastamento da cólera divina; e, como instrumentação material para realizar estes objectos, o templo, o padre, o altar, os ofícios, a vestimenta, a imagem. Pergunte a qualquer mediano homem saído da turba, que não seja um filósofo, ou um moralista, ou um místico, o que é Religião. O inglês dirá:--«É ir ao serviço ao domingo, bem vestido, cantar hinos». O hindu dirá:--«É fazer poojah todos os dias e dar o tributo ao Mahadeo ». O africano dirá:--«É oferecer ao Mulungu, a sua ração de farinha e óleo». O minhoto dirá: --«É ouvir missa, rezar as contas, jejuar a sexta-feira, comungar pela Páscoa». E todos terão razão, grandemente! Porque o seu objecto, como seres religiosos, está todo em comunicar com Deus, e esses são os meios de comunicação que os seus respectivos estados de civilização e as respectivas liturgias que deles sairam, lhes fornecem. Voilà ! Para V., está claro, e para outros espíritos de eleição, a Religião é outra coisa--como já era outra coisa em Atenas para Sócrates e em Roma para Séneca. Mas as multidões humanas não são compostas de Sócrates e de Sénecas--bem felizmente para elas, e para os que as governam, incluindo V. que as pretende governar!

De resto, não se desconsole, amigo! Mesmo entre os simples há modos de ser religiosos, inteiramente despidos de Liturgia e de exterioridades rituais. Um presenciei eu, deliciosamente puro e íntimo. Foi nas margens do Zambeze. Um chefe negro, por nome Lubenga, queria, nas vésperas de entrar em guerra com um chefe vizinho, comunicar com o seu Deus, com o seu Mulungu (que era, como sempre, um seu avô divinizado) . O recado ou pedido, porém, que desejava mandar à sua Divindade, não se podia transmitir através dos Feiticeiros e do seu cerimonial, tão graves e confidenciais matérias continha... Que faz Lubenga? Grita por um escravo: dá-lhe o recado, pausadamente, lentamente, ao ouvido: verifica bem que o escravo tudo compreendera, tudo retivera: e imediatamente arrebata um machado, decepa a cabeça do escravo, e brada tranquilamente-- «parte»! A alma do escravo lá foi, como uma carta lacrada e selada, direita para o Céu, ao Mulungu. Mas daí a instantes o chefe, bate uma palmada aflita na testa, chama à pressa outro escravo, diz-lhe ao ouvido rápidas palavras, agarra o machado, separa-lhe a cabeça, e berra:-- «Vai!»

Esquecera-lhe algum detalhe no seu pedido ao Mulungu... O segundo escravo era um pós-escrito...

Esta maneira simples de comunicar com Deus deve regozijar o seu coração. Amigo do dito.-- FRADIQUE

 


1. Muitas das cartas de Fradique Mendes, aqui publicadas, são naturalmente escritas em francês. Todas essas vão acompanhadas da indicação abreviada trad. (traduzida).